Há muitos anos não víamos um futebol tão bem jogado, capaz de encher os olhos do torcedor brasileiro. Quando a uniformização dos estilos do jogo, fruto da integração do esporte à lógica do rendimento empresarial, parecia dominar todos os clubes brasileiros e nossa própria seleção nacional, a equipe do Santos, campeã paulista de 2010, fez a magia do futebol renascer.
Neymar, Paulo Henrique Ganso, Robinho e Cia estão mostrando que não se ganha títulos apenas com um modo de jogo burocrático, repleto de chutões, cruzamentos em direção à grande área, força física e volantes brucutus. A bola no chão – que só se levanta no momento do lindo “lençol” – os toques rápidos, os dribles, a paradinha, a velocidade e a busca incessante pelos gols são as marcas desse time que vem retomando o brilho do esporte mais popular do mundo.
Da Inglaterra ao Brasil, das elites ao povão
Criado nos colégios burgueses da Inglaterra na primeira metade do Século XIX, o futebol ganhou status de esporte popular em todo o planeta em meados do Século XX. Primeiro foi a classe trabalhadora inglesa que tomou o jogo dos patrões para si, praticando o futebol na suas escassas horas de lazer e construindo grandes clubes nos principais bairros operários de seu país.
No Brasil, o jogo chegou em 1894 e a partir de então foi conquistando devagarzinho o povo, rompendo com o elitismo inicial que encarava o futebol como um esporte para os brancos industriais. Foram os pés negros de tantos craques – Leônidas da Silva, Garrincha, Pelé e vários outros – que transformaram o jogo europeu em uma realização quase artística, parte importante do imaginário nacional brasileiro.
Os craques do Santos de hoje são parte desta tradição, do futebol alegre, malandro, circense, jogado nas areias das praias, nas ruas mal-asfaltadas, nos campos de várzea. O futebol que é brincadeira, que mistura profissionalismo e diversão, que nos faz esquecer e inverter por alguns instantes as dificuldades de viver em uma sociedade que explora e oprime a maioria da população.
No capitalismo, tudo vira mercadoria
Os jovens jogadores do Santos nos fazem lembrar de um tempo no qual a lógica de mercado e a ganância dos capitalistas ainda não tinham tomado conta do futebol. Tempos áureos do nosso futebol, do tricampeonato mundial (1958, 1962 e 1970), quando as camisas só estampavam os escudos dos clubes e o suor dos jogadores.
Atualmente, na fase decadente do capitalismo, o futebol é uma das mercadorias mais rentáveis em todos os continentes. A diferença é que em nossos dias o espetáculo não só serve para alegrar multidões, que vão ao delírio com as belas jogadas e os gols, mas também serve para divulgar grandes empresas multinacionais e marcas de material esportivo, para fazer lucrar as emissoras de televisão. Os uniformes agora são outdoors, os craques são garotos-propaganda e os clubes são empresas.
Nossos garotos são mais um produto para exportação
O Brasil está na periferia do capitalismo. Temos uma economia dependente do Imperialismo. As empresas estrangeiras não apenas exploram nossos recursos naturais e nossa força de trabalho, como também querem lucrar com nossos artistas da bola.
Jogadores brasileiros são vendidos para o exterior cada vez mais cedo. Meninos de origem humilde, filhos da classe trabalhadora brasileira, que vão jogar futebol em algum canto do mundo para encher o bolso de empresários, patrocinadores e magnatas do esporte. Os times brasileiros estão atolados em dívidas, fruto da corrupção que toma conta das administrações e das diretorias dos clubes nacionais, que não podem garantir a permanência de seus melhores atletas, cooptados pelas promessas de sucesso e fortuna nos gramados da Inglaterra, Espanha ou Itália.
Esse deve ser o futuro dos meninos da Vila. O assédio dos empresários e o sonho alienado de comprar mansões, roupas finas e carros de luxo formam uma pressão incontrolável na cabeça dos jovens jogadores. A próxima janela de transferências, na pré-temporada do futebol europeu, dever ser o limite. O show vai acabar, o time será desmontado e o futebol brasileiro vai perder seus representantes mais legítimos e inspirados.
E o torcedor?
O torcedor, o trabalhador que fica no vermelho todo fim do mês para ver seu time jogar, que faz hora-extra, bico ou empresta dinheiro para poder pagar R$ 50 no ingresso para ir ao estádio, é o mais prejudicado nessa história. Em poucos meses, a equipe que hoje encanta e alegra a vida de milhões será apenas uma lembrança na mesa do bar, no vestiário da fábrica, no imaginário dos trabalhadores. Neymar, Ganso, Robinho e seus companheiros estarão ganhando milhões e gerando lucros exorbitantes para grandes empresas. Até lá, só resta aos torcedores, santistas ou não, que gostam do futebol-arte e da ginga, aproveitar os jogos desses garotos.
Resta-nos a pergunta: até quando o futebol brasileiro, orgulho de nosso povo, servirá aos lucros capitalistas? Acreditamos que só quando os clubes forem administrados democraticamente pelos seus próprios sócios, quando o governo ajudar a garantir a permanência dos atletas brasileiros em nosso país. E, fundamentalmente, quando o futebol deixar de ser mercadoria, quando o capitalismo deixar de existir, e com ele a exploração.
Escrito por: Robson Botelho e Vinicios Zaparoli, de São Paulo (SP)
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